A Filomena nunca
teve uma vida fácil. Agora muito menos de que dantes. Anos atrás, ela tinha uma
banca no seu bairro onde vendia coisas básicas que toda a gente precisa. Uma
lei estúpida tirou ela de vez daquele lugar. Ela veio aqui parar, na Avenida
dos Mártires de Inhaminga, ao lado do Porto. É dona duma banca onde vende o que toda a gente precisa nesse lugar: comida e bebidas. Foi assim
que nos conhecemos, a Filomena e eu. Eu, a caminho do Bairro das Mahotas e a
espera duma chapa para ir até Magoanine, estava ali, de pé, parado. Mas ficar
de pé parado não combina com o meu jeito. Num piscar de olho, avistei a sua banca
por não ter muita gente. Depois de muitas andanças a procura duma coisa
qualquer para o meu ultimo filhinho, precisava mesmo de repousar um bocadinho ou talvez tinha a garganta seca, disso não me lembro muito bem. Pedi uma 2M, como
sempre faço. Começamos a falar. A Filo contou me a vida toda dela. Só luta.
Ultimamente, a Câmara de Maputo quer tirar as bancas todas dali, para realizar
uma coisa qualquer, uma coisa que não combina com bancas podres onde vende-se
cervejinhas e espetadas de porco e galinha. Essa história lembrou-me outra, a
do Bar Aleixo na Parede, na Tuga. Uma tragédia que se repete a medida que avança a
“Modernice”, essa doença trágica. Ao longo das minhas paradas, a Filomena
acostumou-se com a minha presença. Ela podia abracar-me enquanto chupava
tranquilamente a minha cerveja, até dava-me uns beijinhos. Solidariedade filho!
Nunca queixei-me. Para que? Não gosto de complicações e muito menos com as mulheres!
A Filomena tinha corpo de guerreira, uma cabeça acima da minha. Mas ela era um
doce. O nosso futuro nunca teria ido além duma relação nessa banca. Aventureiro, eu sou. Maluco é que não. Continuava a preocupar-me essa coisa da Câmara.
A Filomena e eu temos muito mais coisas em comum. Aliás, temos todo em comum.
Que ela seja negra e eu branco não muda nada a situação. Ambos, somos irmãos.
Entender a situação da Filomena é muito mais fácil
para mim do que entender os
planos da Câmara de Maputo, ou de qualquer câmara ou administração cega que
seja. E, a Filomena entendeu-me também, cheirou-me, pegou-me, sabe um bocadinho
de mim. Ela não sabe nada da Câmara e nunca ira saber.
Já há meses que não
tenho noticias dela. Na ultima vez que nos encontramos, tinha pedido a ela para
guardar-me as tampas das cervejas. Expliquei-lhe que com isso ia fazer
desenhos. Certamente, ela pensou que aquele branco era meio tarado e que há
coisas mais importante na vida. Concordo plenamente. Mas tenho a certeza que
ela ainda se lembra de mim tal como eu lembro-me dela.
Amiga, espero que estejas bem, que ninguém te chateia. Da próxima vez que nos encontramos, havemos de nos abraçar novamente e, se por acaso, tens as tampas, não sei...hei de pensar...mas sou capaz te dar um beijo de verdade, pelo menos na testa! Sabes, a minha
fofa não é tão chata como a Câmara municipal de Maputo, mas, mesmo assim, ela tem os
seus dias!
Amiga, espero que estejas bem, que ninguém te chateia. Da próxima vez que nos encontramos, havemos de nos abraçar novamente e, se por acaso, tens as tampas, não sei...hei de pensar...mas sou capaz te dar um beijo de verdade, pelo menos na testa!
Filomena, escrevi
essa nota pensando em ti a ouvir o Beethova Ova, um músico do Haiti. Ele tem
dessas músicas doces como o Nèg Kongo, ou Lina.
Fotos minhas, tiradas em 2013, no Centro Cultural Franco-Moçambicano
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